sexta-feira, 20 de setembro de 2024

O ensino público tem que ser militarizado para ter sucesso?

Antes que se diga que esta reportagem é “antimilitar”, “petista”, “esquerdista” e coisas do gênero, vale ressaltar a importância do militarismo no Brasil e claro, todos os méritos que uma vida pontuada por inúmeros princípios, responsabilidades e amor à pátria traz ao ser humano. A vida militar é respeitável, como respeitáveis são inúmeras outras carreiras. 

Este repórter, filho de militar federal com extremo orgulho, antes de se apaixonar pela Comunicação, se interessou também em vestir uma farda e seguir carreira no quartel. É preciso entender qual é o objetivo do militar, da sua formação. O militar zela pela ordem e segurança nacional. A formação militar, tem nas instituições de ensino dos quartéis os seus princípios e valores que prezam pela conduta e claro, formação de bons militares para serviço. 

No entanto, os princípios que regem uma vida militar, tais como o respeito, a responsabilidade, a ética, a disciplina, o amor à pátria e ao semelhante, jamais dependeram da farda ou de qualquer sistema para serem seguidos, contanto, que sejam bem ensinados, podendo existir em quaisquer instituições. E claro, a metodologia de ensino, também pode ser aplicada, dentro e fora dos quartéis.

Da mesma forma quando se pensa na responsabilidade que se “coloca” nos ombros dos jovens, fardados ou não. Na importância de prepará-los para a vida e para o futuro do país. O que é necessário para isso? É daí que se pergunta: a escola pública, precisa ser militar para ensinar e encaminhar os jovens para uma vida profissional?

Recentemente, o Governo Tarcísio de Freitas sofreu uma derrota na Justiça de SP. A lei que instituiu em maio, a escola cívico-militar no Estado, foi suspensa em agosto, em virtude de uma queixa do Sindicato dos Professores do Estado, de que a lei não atendia aos regulamentos do Ministério da Educação e, portanto, era inconstitucional.

O governo chegou a fazer uma consulta na rede pública de ensino, através da qual,  instituições se manifestaram a favor da conversão. No total, mais de 300 escolas estaduais da rede pública de ensino manifestaram o desejo de adotar um sistema militar na didática com os alunos. Dentre elas, escolas que levam os nomes do jornalista Vladimir Herzog e do escritor Mário de Andrade.  

Significa melhora no ensino?
Primeiro, a iniciativa não implica transformar escolas em quartéis. A intenção do governo é que haja colaboração dos militares em escolas com baixo IDEB – Índice de Desenvolvimento de Educação Brasileiro

Segundo a Secretaria de Educação: “Nessas escolas, os militares também não atuarão como professores nem como diretores, apenas como profissionais de apoio, na entrada, saída e intervalos de aula, no sentido de auxiliarem em projetos educativos extraclasses e na busca ativa dos alunos. O projeto não altera e nem interfere no sistema pedagógico de ensino público, atuando de forma livre para que todos os profissionais de educação tenham espaço para trabalhar e qualquer escola pode ter aderência, desde que não tenha ensino noturno”.

Alguns professores são contra e outros, a favor: “Eu acho uma excelente ideia. Sou professora aposentada, com 80 anos. No meu tempo de trabalho, não havia tanta falta de educação e respeito com o professor. Eu acredito que com a presença dos militares na escola, os maus alunos se sintam mais intimidados em perturbar a sala e também ameaçar ao professor, que precisa de segurança para se sentir motivado”, afirma Lourdes Joaquim. 

“Eu discordo porque quem trabalha no sistema público de ensino atual, sabe que o professor precisa de mais responsabilidade e liberdade de atuar. Em sala, não podemos criticar, não podemos chamar a atenção do aluno, e tem ainda essa questão da aprovação automática, que é um ‘problemaço’, visto que o aluno não aprende nada e é aprovado. O que adianta um militar dentro da escola, eu te pergunto?”, afirma a professora estadual Cynthia Falabella.

Qual a qualidade do atual ensino público?
Em 2023, a média alcançada no Ideb ficou abaixo da meta estabelecida pelo Ministério da Educação, sendo de 4,3 ante os 5,2 estabelecidos pelo governo.

A Escola Preparatória Cadetes do Ar, em Barbacena – MG, da rede federal, foi a que registrou a nota 7,8, a mais alta do país, ocupando o primeiro lugar.

Em segundo lugar, com a nota 7,5, vem a Escola Agrícola Federal Padre Eliésio dos Santos – na cidade de Ipueiras – CE.

Do estado de São Paulo, o colégio Técnico Industrial Prof. Isaac Roldan Unesp, em Bauru, ocupou a sexta posição em todo país.

O que dizem os especialistas?
O sociólogo e consultor educacional Cesar Callegari e a escritora, palestrante, professora e consultora Clara Cecchini acreditam que a proposta não atende às necessidades do sistema público de ensino atual.

“Policiais são treinados para a contenção e para a repressão. São o braço do Estado para o uso da força. Sua visão de organização é a tropa, onde não se admite a divergência e se preconiza a obediência cega no cumprimento de ordens. Reduzir a disciplina escolar à visão militarista tira dos estudantes a oportunidade de desenvolver seu verdadeiro sentido. É na interação entre as crianças e jovens, e deles com seus professores e com a comunidade, que se constrói o clima de segurança e respeito coletivo – e não pela repressão”, afirmam os especialistas.

Fica claro, que o Governo Estadual precisa ponderar muito sobre os reais objetivos com a iniciativa. É fato que a sensação de segurança na instituição pública de ensino é primordial e necessária. E também é fato que o sistema militar tem um método de ensino exemplar, mas que não fica distante dos demais sistemas de ensino, por exemplo, de escolas públicas dos mais longínquos lugares do país. 

Desta forma, se a intenção é impor mais ordem e respeito, não seria melhor contratar seguranças para as escolas? Se a intenção é aquilatar o ensino, bons exemplos não faltam. Não bastaria olhar com atenção e “copiar” a cartilha? 

Apenas dispor de militares nas dependências, não seria o mesmo só trocar a roupa por uma farda no sistema de ensino? 

Reportagem: Fernando Aires. Foto: Divulgação.

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