sábado, 27 de abril de 2024

O pêndulo eleitoral paulistano

São Paulo é uma cidade complexa, diversificada, extremamente desigual, mas, ao mesmo tempo, democratizante e republicana. Um cidadão paulistano que mora no bairro de Higienópolis pode viver em média 80 anos, enquanto em Paraisópolis, a expectativa de vida pode ser de 65 anos, em média. Trata-se de uma megalópole que abriga em suas praças e avenidas a maior manifestação anual cristã do país, com a “Marcha para Jesus”, assim como oficializa em seu calendário de eventos a “Parada LGBTQIAPN+”.

A cidade elegeu prefeitos com perfis tão diversos que nos auxilia a compreender tamanha complexidade. Prova disso encontra-se nas duas primeiras eleições municipais da Nova República, quando os paulistanos escolheram o tradicional e conservador político Jânio Quadros, para logo em seguida eleger Luiza Erundina, uma mulher do Partido dos Trabalhadores (PT), que serviu de apoio para a chegada de Lula ao segundo turno das eleições presidenciais de 1989.

Repetindo esse perfil eleitoral, nos anos 1990, a capital escolheu o conservador Paulo Maluf e, com seu apoio, Celso Pitta, o primeiro negro eleito pelo voto popular a liderar a maior cidade do país, entre os anos 1993 e 2000. Assim como ocorreu anteriormente, após mandatos conservadores, São Paulo elegeu mais uma mulher do PT, Marta Suplicy, antecipando outra robusta candidatura de Lula à presidência, culminando em sua vitória.

Marta não conseguiu se reeleger. Durante todos os anos restantes do governo Lula, a cidade escolheu candidatos do Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e seus aliados: Serra e Kassab. Novamente, após oito anos de governos de centro-direita, a capital paulistana, em 2012, elegeu um prefeito petista. Todavia, assim como ocorreu com Erundina e Marta, que não conseguiram alavancar uma sucessão ou se reeleger, Fernando Haddad também governou a cidade por apenas um mandato, quando foi derrotado por João Dória nas eleições de 2016. De lá para cá, São Paulo completou mais oito anos de governos tucanos em parceria com outros partidos de centro-direita.

Atualmente, São Paulo é governada por Ricardo Nunes (MDB), que chegou ao poder após a morte de Bruno Covas, acometido por um câncer em seu segundo mandato. Até meados de 2023, a imagem do atual prefeito era desconhecida por uma grande parte da população paulistana.

A candidatura de Nunes busca amalgamar o resquício da tradição tucana de São Paulo, desgastada após as renúncias de José Serra e João Dória, que prometeram encerrar seus mandatos, mas abandonaram o cargo para concorrer à presidência e ao governo paulista, juntamente com o apoio do conservadorismo bolsonarista, que não reelegeu o ex-presidente, mas que saiu vitorioso em várias eleições para governadores e deputados em 2022. Nunes possui alguns números positivos em sua gestão, como a redução da violência no que diz respeito à taxa de homicídios por habitantes. Porém, o crescimento do número de moradores de rua e os problemas adjacentes a isso nas regiões centrais da cidade vêm gerando uma imagem de abandono do poder público na cidade.

Em primeiro lugar nas pesquisas, Guilherme Boulos (PSOL) costurou uma aliança com Marta Suplicy, recém-filiada ao PT, com o objetivo de combater justamente esse caos, pois sua principal bandeira sempre foi a luta pelo acesso à moradia. Fiel apoiador de Lula, Boulos convenceu a principal liderança do PT a abrir mão de uma candidatura própria após o fiasco das eleições passadas, quando Jilmar Tatto ficou apenas em sexto lugar. Trata-se de uma decisão que pode impactar o futuro petista quando Lula sair de cena.

O fiel da balança será o perfil conservador ou centrista dos candidatos a ocupar uma terceira via nesse processo. Ricardo Salles e Tabata Amaral, rivais políticos em alguns debates, representam perfis diferentes da direita e do centro, respectivamente. No entanto, ambos poderão decidir qual caminho as eleições terão em um provável segundo turno, quando Boulos, caso consiga manter sua dianteira, terá uma forte concorrência de um perfil tucano (Tabata Amaral), tucano-bolsonarista (Ricardo Nunes) ou bolsonarista-tucano (Ricardo Salles ou outro).

Prevendo a atual necessidade de arregimentar forças da centro-direita para a vitória de Boulos, Lula já começou a campanha ao afagar seu rival Tarcísio de Freitas, governador de SP e aliado de Bolsonaro, assim como vem evitando derrubar a imagem de Tabata Amaral, possível futura aliada. Caso o lulismo consiga costurar novos apoios, pode ser que São Paulo opte pelo lado esquerdo do pêndulo, pela quarta vez na Nova República.

* Victor Missiato, analista político, doutor em História Política e professor do Colégio Presbiteriano Mackenzie

Foto: Divulgação.

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